O Brasil, maior país da América Latina, ainda é destaque negativo em eficiência na distribuição de água potável nas suas cidades.
Isso de acordo com o recente estudo do Instituto Trata Brasil “Perdas de Água Potável” (2021, ano base 2019). Pelo estudo, quase 40% (39,2%) de toda a água potável não chega de forma oficial às residências do país.
Isso equivale a 7,5 mil piscinas olímpicas de água tratada desperdiçadas diariamente, ou sete vezes o volume do Sistema Cantareira – maior conjunto de reservatórios para abastecimento do Estado de São Paulo.
O estudo foi realizado em parceria com a Associação Brasileira dos Fabricantes de Materiais para Saneamento (Asfamas) e elaborado pela consultoria GO Associados.
O relatório usa dados públicos do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento (SNIS) e contempla as 27 unidades da Federação, das cinco regiões brasileiras, bem como as 100 maiores cidades do Ranking do Saneamento Básico.
Segundo o Instituto, mesmo considerando apenas os 60% deste volume contabilizado que são referentes a perdas físicas (vazamentos), a quantidade seria suficiente para abastecer mais de 63 milhões de brasileiros em um ano, ou 30% da população brasileira em 2019.
Ou seja, recuperar esse volume poderia ajudar a para levar água aos quase 35 milhões de brasileiros que até hoje não possuem acesso nem para lavar as mãos em plena pandemia de covid 19.
O volume desperdiçado também atenderia por quase três anos aos mais de 13 milhões de brasileiros que moram em favelas.
Impacto Ambiental
O Trata Brasil também destaca o impacto ambiental, lembrando que o volume de água que seria economizado da natureza ajudaria a manter mais cheios os rios e reservatórios espalhados pelo país.
O impacto seria sentido até na geração de energia elétrica, uma vez que a atual escassez de chuvas tem feito o Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) divulgar seguidos alertas sobre o risco de desabastecimento nas usinas.
Segundo cálculos do Instituto, caso o Índice Perdas de Faturamento Total caísse dos atuais 40% para índices próximos a 25%, meta prevista pela Portaria Nº 490 do Ministério do Desenvolvimento Regional, a economia chegaria a 2,2 bilhões de m³. Só isso já seria suficiente para atender a aproximadamente 39 milhões de brasileiros num ano.
Considerando a análise dos indicadores Índice de Perdas na Distribuição e Índice de Perdas por Ligação, o estado de Goiás foi o que apresentou a menor perda e o Amapá, a maior. Nada menos que 15 unidades da Federação apresentam indicadores piores que a média nacional.
A região que mais apresentou piora no período 2015-2019 foi o Norte, com aumento de 0,09 ponto percentual. Já a região Centro-Oeste teve desempeno melhor, com redução de 0,01 ponto percentual nos anos avaliados.
Comparação internacional
O Brasil também não consegue se destacar positivamente quando tem seus índices de perdas comparados aos de outros países, independente do grau de suas condições econômicas.
Utilizando como referência a International Benchmarking Network for Water and Sanitation Utilities (IBNET), o Índice de Perda de Faturamento Total (IPFT) do Brasil em 2019 alcançou 41%, pior que países como Camarões (40%), África do Sul (34%), Etiópia (29%), Reino Unido (21%) e Polônia (17%), por exemplo.
Mesmo na comparação entre os países da América Latina, o resultados do Brasil podem ser considerados insatisfatórios: ficamos em 5º lugar entre os 10 países analisados. E estamos muito mais próximos do último colocado (Colômbia, com 46%), do que do primeiro (Chile, com 31%) em termos relativos.
Para essa comparação, o estudo utilizou os dados da Asociación de Entes Reguladores de Agua Potable y Saneamiento de las Americas (ADERASA), que possui dados desagregados de 115 operadores de saneamento nesses 10 países latino-americanos.
Ganho financeiro
O Trata Brasil também calculou os possíveis ganhos financeiros que seriam obtidos com uma redução das perdas de água potável no Brasil.
Tomando como referência o cenário base do governo federal e considerado otimista pelo estudo, com redução das perdas para 15% até 2034, o potencial de ganhos brutos atinge R$ 54,1 bilhões. Prevendo que metade deste valor precisaria ser reinvestido no próprio combate às perdas, o benefício líquido ainda assim seria da ordem de R$ 27,1 bilhões em 15 anos.
Já no cenário considerado realista, com perdas de 25% ao final do período, os ganhos bruto e líquido trazidos a valor presente são, respectivamente, de R$ 24,8 bilhões e R$ 12,4 bilhões.
Para Gesner Oliveira, sócio da GO Associados, a solução para as perdas de água no Brasil passa por ações melhor estruturadas e maior eficiência dos sistemas de saneamento, conjuntamente a um combate mais efetivo aos furtos de água.
“Também é fundamental investir em materiais de qualidade, que suportem as exigências técnicas das redes de água com mais robustez e eficiência, garantindo menos vazamentos e melhor aproveitamento dos recursos hídricos. Estamos falando de milhões de pessoas sem acesso a esse recurso essencial e o estudo evidencia que a redução das perdas de água pode ser a solução do ponto de vista social e de sustentabilidade para este histórico problema.”
O estudo completo está disponível em: Trata Brasil